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O pitoresco e histórico Morro da Conceição
05 Maio 2015 | Por Márcia Pimentel
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1ladeiraCasario centenário, edificações coloniais, cadeiras postadas na calçada estreita e conversas nas janelas sem grades, interrompidas para comprar o pão quentinho do padeiro que passa. Pela descrição, muitos devem deduzir que estamos falando de alguma cidadezinha do interior, perdida no tempo. Mas o lugarejo está encravado em pleno coração do Rio, entre a Praça Mauá e as ruas Acre, da Conceição, Senador Pompeu e Sacadura Cabral.

Trata-se do Morro da Conceição, um dos recantos mais pitorescos da cidade, repleto de marcos arqueológicos e arquitetônicos que guardam um rol de histórias sobre o Rio. Afinal, integrou – junto com os morros do Castelo, de São Bento e de Santo Antônio – o quadrilátero que delimitava o perímetro urbano da cidade colonial. É uma joia urbanística ocultada pelos prédios altos da Avenida Rio Branco, que poucos cariocas conhecem, mas que muitos artistas já descobriram, dada a quantidade de ateliês localizados na Ladeira João Homem, uma das opções de subida do morro a pé.

Segundo o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan), o nome do lugar tem relação direta com a capela que a devota Maria Dantas construiu em 1634, em adoração à Nossa Senhora da Conceição. A partir dessa ermida, os padres capuchinhos ergueram um convento que, entre 1699 e 1702, foi reformado e ampliado pelo bispado do Rio para que se transformasse no Palácio Episcopal, ou seja, na residência oficial dos bispos da diocese.

Atualmente, a edificação abriga o Museu Cartográfico do Serviço Geográfico do Exército e pode ser visitado, gratuitamente, de segunda a sexta-feira. Em exposição, bússolas, lunetas e outros instrumentos, além de um raríssimo mapa do território brasileiro do século XVIII.

fortaleza conceiçaoNos fundos do Palácio Episcopal está a Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição, cuja construção foi iniciada em 1713, dois anos depois do episódio em que o Rio de Janeiro ficou cerca de 60 dias sob o domínio de corsários franceses. O forte foi erguido no mesmo lugar em que o chefe dos piratas, René Duguay-Trouin, instalou uma bateria de artilharia para ataque à cidade. Décadas depois, a fortificação também ganhou masmorras, para onde eram encaminhados os presos tidos como perigosos pelo governo colonial, a exemplo dos inconfidentes mineiros.

Essas, contudo, são apenas algumas das 1001 histórias que o morro tem para contar.

A primeira política higienista e o Valongo

Em meados do século XVIII, a população carioca estava mobilizada com a discussão sobre o aumento dos focos de epidemias da cidade – como o escorbuto, a sífilis, a erisipela, a bexiga, a sarna e outras pestes. Em meio aos debates, a Câmara Municipal definiu aquela que tem sido considerada como a primeira política higienista do Rio de Janeiro. Baseados na ideia de que os navios negreiros chegavam da África carregados de doenças, os vereadores aprovaram leis que proibiam o desembarque e o comércio de escravos na área mais nobre e adensada da cidade (a região da atual Praça Quinze).

valongoO novo lugar destinado ao desembarque e ao comércio negreiro foi o Valongo, cujo cais ficou pronto em 1758. A medida sofreu resistência inicial por parte dos comerciantes estabelecidos nos antigos logradouros, mas, com o tempo, o tráfico se transferiu para lá, fato que acabou projetando o perímetro urbano da cidade para além do Morro de São Bento, povoando a Prainha, a Saúde e a Gamboa, que se encheram de trapiches (armazéns) e de novas residências de grandes comerciantes. Por ter águas mais profundas, a região do Cais do Valongo foi, aos poucos, se consolidando como a mais importante área portuária da cidade, para onde se dirigiam os navios de maior calado. Tanto que foi lá que desembarcou, em 1843, Dona Teresa Cristina, a futura esposa do imperador Dom Pedro II. Desde então, e com nova ornamentação, se transformou no Cais da Imperatriz.

As ruínas do Cais do Valongo/Imperatriz foram encontradas durante as obras de revitalização da zona portuária e podem ser vistas na esquina das ruas Barão de Tefé e Sacadura Cabral. Estima-se que por lá passaram cerca de um milhão de africanos. Outros achados arqueológicos das escavações, como talheres, jarros e objetos de higiene pessoal, estão em exposição na Casa da Guarda do Jardim Suspenso do Valongo, localizado na subida do morro, na Rua Camerino. O Jardim, projetado em 1906, também abriga as estátuas de Minerva, Marte, Ceres e Mercúrio, que ficavam no Cais da Imperatriz.

psalNão muito longe das ruínas do cais, na Rua Pedro Ernesto, um outro sítio arqueológico foi descoberto, quando um casal de moradores fazia obras em sua casa. Embaixo da estrutura do prédio, havia um cemitério secular de negros vindos da África que, doentes, morriam antes de serem comercializados. E, para não apagar esse capítulo da história do país, o local foi transformado no Memorial Cemitério dos Pretos Novos.

Pedra do Sal e outras paragens

Na virada do século XIX para o XX, grupos de negros costumavam se encontrar no antigo lugar onde era descarregado o sal importado de Portugal, nas proximidades do Largo da Prainha, para fazer batucadas, após um duro dia de jornada de trabalho na estiva. Não à toa, a Pedra do Sal virou, na época, ponto de inúmeras manifestações culturais, tais como os ranchos carnavalescos, e reduto de uma série de músicos, a exemplo de Pixinguinha, Donga e João da Baiana. Hoje, a Pedra do Sal continua sendo palco de animadas rodas de samba.

obs valongoO Morro da Conceição tem ainda outros pontos que merecem ser visitados. O Observatório do Valongo, sede do curso de Astronomia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por exemplo, oferece algumas programações abertas ao público, como a observação noturna do céu. O casario do morro também é uma atração à parte. Vários de seus sobrados e vilas datam do século XIX, quando imigrantes, principalmente portugueses, mudaram-se para lá atraídos pelas possibilidades de trabalho oferecidas pelo cais do porto. As casas mantêm-se conservadas até hoje e, em muitas delas, ainda moram os descendentes dos imigrantes.

Fontes:

. Morro da Conceição, uma Etnografia da Sociabilidade e do Conflito numa Metrópole Brasileira. Flávia Carolina da Costa.
. Os Portos do Rio de Janeiro Colonial. Fania Fridman e Mario Sergio Natal Ferreira.
. Rio de Janeiro: Memória e Espaço Portuário. Icléia Thiensen e Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros.
. A Utopia da Pequena África: Projetos Urbanísticos, Patrimônios e Conflitos na Zona Portuária Carioca. Roberta Sampaio Guimarães.
. Sal Português para as Américas. Jorge Martins Ribeiro.
. Portal da Fundação Cultural do Exército.
. Portal Museus do Rio.
. Portal Mapa de Cultura RJ.

 
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