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A gentileza venceu a violência na E.M. Rosa do Povo
14 Junho 2017 | Por Márcia Pimentel
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BazarMaes RosaDoPovo
Bazar organizado pelas mães para arrecadar dinheiro para a festa junina. Foto Alberto Jacob Filho, 2017, MultiRio

No portão de entrada da E.M. Rosa do Povo (7ª CRE), no bairro da Taquara, uma das unidades da Rede Municipal que tem se destacado por suas boas notas no IDE-Rio e Ideb, um tabuleiro com roupas e quinquilharias usadas chama a atenção de quem entra ou passa. É o bazar organizado por um grupo de mães com o objetivo de arrecadar recursos para a primeira festa junina da escola aberta à comunidade. O motivo da iniciativa é logo revelado: “Muitos moradores das redondezas acham que a Rosa do Povo é horrível e a gente quer mudar essa imagem”, diz Mônica, mãe de um aluno do segundo ano.

Pela diretora, Márcia Elizabeth da Matta Vicente, as festas juninas continuariam a ser apenas internas, mas ela respeita e acata a decisão do grupo de mães: “Realmente, aqui tinha uma fama muito ruim em função dos eventos violentos que frequentemente ocorriam”. Aliás, foi por causa de um desses episódios – em 2008, quando o carro de um professor foi incendiado no estacionamento da escola – que ela foi convocada para comandar a unidade, em meio a uma série de outras medidas da 7ª CRE.

Se entre os moradores da Taquara a imagem da violência ainda persiste, para a 7ª CRE isso já virou passado. Além da unidade figurar entre as dez de melhor desempenho na região – 7,4 no IDE-Rio e 6,6 do Ideb, segundo as últimas notas divulgadas –, não registra mais incidentes preocupantes desde a intervenção em 2008. Mas, até chegar a esse patamar, foi uma longa história de mudanças pedagógicas e nas relações humanas.

Da opressão à voz ativa

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A diretora Márcia Elizabeth deu voz aos alunos. Foto Alberto Jacob Filho, 2017, MultiRio

Pouco tempo após sua inauguração, em 1982, a E.M. Rosa do Povo, construída para atender as crianças do conjunto habitacional Mirante da Taquara, passou a acolher alunos oriundos de diversas pequenas comunidades do entorno: Invasão, Cabeça de Porco, Rabo de Porco, Morro do Jordão, Morro do Pica-Pau e outras mais. No início dos anos 2000, já era uma das escolas de mais fraco desempenho da 7ª CRE, com frequentes incidentes violentos. Em função disso, havia se transformado em uma unidade de passagem, ou seja, onde o aluno só ficava até conseguir uma vaga em outro lugar.

Márcia Elizabeth conta qual foi sua percepção quando chegou à escola, pouco depois do episódio de 2008: “O que vi foi uma comunidade de alunos sem voz, oprimida pela tirania de professores que não acreditavam no potencial daquelas crianças. E, como também tenho formação em Psicologia, logo entendi que a violência e a depredação do prédio eram a forma como aquela opressão se manifestava”.

Diante de tal quadro, uma de suas primeiras providências foi a de promover assembleias com os alunos para que eles tivessem um canal de expressão e exposição de suas demandas. As maiores reclamações eram dirigidas ao tipo de aula e à forma como eram tratados. “Eu mesma assisti a uma cena emblemática, quando um aviãozinho de papel atingiu, sem querer, uma professora. A reação dela foi exacerbada”, diz a diretora. Os demais professores, explica, saíram descontrolados das salas de aula para acudi-la como se tivesse havido um grande ato de agressão.

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Alunos brincam no pátio que, outrora, era um dos palcos de tensões. Foto Alberto Jacob Filho, 2017, MultiRio

Mesmo diante da resistência, os docentes também foram ouvidos. Aliás, também tiveram que aprender a ouvir e lidar com as diferenças, já que, no início, alguns não queriam escutar outros com pensamentos divergentes dos seus.

“E, quando vinham falar de aprovação e reprovação de aluno, eu logo cortava e deixava claro que o que me interessava era a discussão sobre aprendizagem”, afirma Márcia Elizabeth, que também constatou que vários professores precisavam de maior capacitação. Graças às verbas do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE), muitos puderam fazer cursos de aperfeiçoamento.

Gentileza gera gentileza

As tensas relações humanas na E.M. Rosa do Povo começaram a se dissipar quando a direção da escola levou a cabo o projeto Gentileza Gera Gentileza. Inúmeras atividades foram desenvolvidas para aumentar a autoestima dos alunos, como mostra de dança, desfile cívico, passeios culturais etc. A mostra de talentos contou, inclusive, com a participação ativa dos professores, que protagonizaram oficinas de massagem, maquiagem e várias outras fora de sua área de atuação profissional (a regra assim exigia), o que permitiu um contato diferente do habitual com os alunos.

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Trabalho de aluno do 3º ano sobre o autor Ziraldo. Foto Alberto Jacob Filho, 2017, MultiRio

Em paralelo, reuniões passaram a ser realizadas semanalmente com toda a equipe de docentes para discutir diagnósticos e fazer planejamento. O resultado de todos esses esforços logo começou a aparecer na visível melhora da disciplina e da aprendizagem dos alunos. Em 2015, o 6º ano experimental da escola conquistou a primeira colocação nas provas de avaliação da Rede. “Aqui, a gente também trabalha o miudinho da sala de aula. Eu e a Cristiane Rocha, a coordenadora pedagógica, lemos toda a produção de texto dos alunos e anotamos tudo o que está dentro ou fora dos parâmetros. Depois damos consultoria para cada professor para realinharmos o que for preciso. Isso faz diferença”, avalia a diretora.

Neste ano de 2017, professores e alunos decidiram pôr em prática um projeto na área de literatura: A Rosa no Mundo Mágico da Literatura Infantil. Cada turma está desenvolvendo um livro e os alunos de cada ano se dedicando a dois autores, um por semestre. O foco, no entanto, está no primeiro ano, onde o mundo das letras se abre diante das crianças junto com o processo de alfabetização.

“Aqui, sempre partimos de pequenos textos já conhecidos pelos alunos, como letras de música, lendas... Extraímos deles algumas palavras para trabalhar a oralidade e a consciência fonológica até chegarmos à análise linguística e à grafia do som. A alfabetização é sempre acompanhada da leitura e da consciência da escrita. A criança precisa se perguntar: Por que escrevo? Para quem escrevo?”, explica Cristiane, a coordenadora pedagógica.

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A coordenadora pedagógica Cristiane Rocha. Foto Alberto Jacob Filho, 2017, MultiRio

A trajetória bem-sucedida da escola, após tempos difíceis, remete aos estudos sobre os motivos do fracasso escolar. A abordagem denominada “Questionamento da Escola” indica que eles podem residir na inadequação dos métodos pedagógicos, na precária formação do docente e na péssima relação professor-aluno, normalmente fruto da dificuldade de lidar com as diferenças culturais. Embora continue enfrentando adversidades que sempre desafiam a equipe a encontrar novas soluções, a E.M. Rosa do Povo é um exemplo de que essas diferenças podem ser superadas e todos os alunos podem, sim, ter boa aprendizagem.



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