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Palácio da Cidade tem a alma do Rio
01 Março 2018 | Por Sandra Machado
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O Palácio da Cidade funciona na antiga embaixada do Reino Unido (Fonte: jornal Extra)

Originariamente, a construção de estilo georgiano surgiu com uma vocação diplomática: a de abrigar a embaixada do Reino Unido no antigo Distrito Federal. Erguida entre 1947 e 1949, ela tem a imponência de uma Casa Branca, com a qual compartilha o padrão arquitetônico. Depois da transferência da capital do Rio de Janeiro para Brasília, em 1960, o governo de Sua Majestade Britânica pretendia se desfazer da propriedade, mas havia a preocupação de que o belo prédio fosse demolido para dar lugar a apenas mais um arranha-céu no bairro de Botafogo. A situação permanecia indefinida até que, durante a presidência do general Ernesto Geisel, ficou decidido que seria feita a fusão dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro. No mesmo dia, 15 de março de 1975, o município do Rio se tornou a nova capital fluminense e seu primeiro prefeito, Marcos Tamoyo, que já havia sido escolhido para o cargo em 22 de fevereiro, se viu, de repente, sem ter para onde ir, uma vez que não existia nenhuma sede para o governo municipal. 

Decoração em estilo Adam (Fonte: jornal Extra)

Começava, ali, um périplo acompanhado com grande interesse pela população e relatado com divertida documentação no livro O Palácio da Cidade 1975-1979, publicado pela prefeitura carioca. De início, o governador Floriano Faria Lima, responsável pela indicação de Tamoyo, sugeriu um convênio com o poder estadual. Mais adiante, alguém teve a ideia de instalar a Prefeitura no Paço da Praça Quinze, onde funcionava a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT). Mas, quando o prefeito foi ver, eram apenas três salas, o que seria inviável para abrigar todo o secretariado. Faria Lima, então, requisitou o prédio inteiro. No entanto, depois de três meses de espera em vão, se cogitou tentar outros endereços: o Solar da Marquesa de Santos, em São Cristóvão; o anexo do Palácio do Catete; e até o Edifício Mayapan, mais conhecido como Bolo de Noiva, que fica no Centro e, mesmo depois de 15 anos da mudança da capital federal, ainda estava ocupado por várias repartições do Ministério da Agricultura. 

“Prefeitura nascida sem sede e sem função”

Diante do impasse logístico, logo a imprensa se encarregou de trazer a discussão para a praça pública. Jornalistas, caricaturistas e populares tratavam do assunto como se fosse piada. Penalizada, uma empregada doméstica chegou a enviar uma carta ao prefeito, oferecendo seu apartamento conjugado no subúrbio para a instalação do gabinete. O cartunista Lan publicou uma série memorável no Jornal do Brasil, na qual, entre outras situações, Tamoyo despachava de um orelhão. Carlos Eduardo Novaes escreveu a crônica O prefeito caracol, onde dizia: “O Rio de Janeiro é, portanto, a única cidade do mundo que tem uma prefeitura itinerante. Todos os dias, pela manhã, antes de sair de casa, o prefeito telefona para seus quatro secretários, que também continuam desalojados, e marca o local da reunião. ‘Alô, professora Teresinha? A nossa reunião de hoje será às 8h ali no Obelisco’. O pessoal se espalha pelos monumentos, despacha e depois sai pela cidade em fila indiana, como num safári, com o prefeito à frente, quatros secretários, seis assessores, três datilógrafos, dois contínuos e cinco carregadores levando carimbos, envelopes, papel timbrado, a garrafa de café e as máquinas de escrever na cabeça”.

Por sorte, apenas cinco dias após a fusão dos estados, o cônsul-geral da Grã-Bretanha, Alan Munro, havia solicitado uma audiência para negociar o destino da antiga embaixada da Rua São Clemente. Prontamente o alcaide fez uma visita e, desde então, acalentou a possibilidade de levar a Prefeitura para lá. Até que, enfim, a proposta recebeu o sinal verde do governador. Avaliadores da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro atribuíram um valor de Cr$ 40 milhões e o prédio foi vendido completamente vazio. Somaram mais Cr$ 45 milhões as despesas com móveis e refrigeração, e o empréstimo concedido pelo Branco do Brasil só foi quitado por completo em 1º de julho de 1981.

Finalmente uma sede à altura da cidade

Assinada a escritura em 3 de julho, no mesmo dia três funcionários municipais começaram a trabalhar – a decoradora Vera Gutierrez Zander, o arquiteto Carlos Werneck de Carvalho e o engenheiro Mário Fernandes Guedes. As instalações foram entregues em 13 de outubro, quando Marcos Tamoyo afirmou, jocosamente, no discurso de inauguração: “Não foi à toa que escolheram São Sebastião como padroeiro do Rio: muita flecha e pouca roupa”. O batismo aconteceu três dias antes, quando o decreto municipal nº 162 sacramentou a denominação definitiva de Palácio da Cidade. 

Salão Nobre de Jantar (Fonte: jornal Extra)

Não foi nada simples para a equipe encarregada escolher uma decoração condizente com o projeto arquitetônico do escocês Robert Prentice, repleto de ornamentos clássicos nas paredes e no teto. Também conhecido como puro estilo Adam, em referência ao trabalho dos irmãos que ditaram moda entre 1765 e 1790, o padrão necessitava de mobiliário brasileiro com uma estética correspondente àquela época. Acabou-se optando por peças do período Dom José I (1765/75) e do período Dona Maria (1775/1800), também chamado de Sheraton brasileiro, para as áreas de destaque do palácio: Salão Nobre de Jantar, Sala Nobre de Recepção, Sala de Reuniões, Hall de Espera e o Gabinete do Prefeito. 

Trabalhos de artistas contemporâneos contrastam com a sobriedade do prédio. É do escultor peruano Mário Agostinelli uma peça que faz referência ao padroeiro da cidade e fica localizada no jardim de inverno do segundo andar: uma imagem de São Sebastião em bronze, de 2,5 metros de altura, composta por arruelas, cadeados, parafusos e outras ferragens. A obra do pintor brasileiro Glauco Rodrigues aparece em quatro retratos, representando o Barão de Mauá, Machado de Assis, Pereira Passos e Oswaldo Cruz. É de autoria do artista plástico italiano Roberto Moriconi uma escultura moderna em aço. No entanto, o acervo também inclui obras de arte antigas, como um armário de laca e marfim e jarros chineses do século XVIII. 

Uma das charges da série de Lan (Fonte: livro O Palácio da Cidade 1975-1979)

Mas é no Salão Nobre de Jantar que a exuberância palaciana atinge seu ápice. Uma tapeçaria com mais de cinco metros de comprimento do mineiro Augusto Ribeiro Degois, representando uma cena pastoral, reveste a parede principal. A mobília importada foi comprada de um embaixador da Grã-Bretanha. Sobre a mesa oval de madeira, fica um imenso lustre, com 3 metros de altura e 66 lâmpadas. E existe, ainda, um par de tocheiros em madeira entalhada, revestido com folhas de ouro, que é atribuído ao Mestre Valentim. 

O conjunto da edificação de quatro andares e da área verde com 60 mil metros quadrados, onde o traçado original dos jardins foi mantido, é tombado pelo município desde 1984. Quanto às personalidades que já tiveram o prazer de desfrutar das instalações, a memória fica a cargo do setor de relações internacionais. Entre convidados ilustres estão a Princesa Diana e o Príncipe Charles e, mais recentemente, o Papa Francisco. Durante o período em que funcionou como embaixada, a Rainha Elizabeth II e o Príncipe Philip se hospedaram nas dependências do palácio durante três dias, em 1968. Hoje, os salões só costumam receber solenidades oficiais ou são cedidos para grandes apresentações culturais. Apesar de todo o engajamento das gerações passadas, atualmente não estão abertos à visitação pública.

Fontes:

O Palácio da Cidade 1975-1979. Prefeitura do Rio de Janeiro, 1979.

Jornal do Brasil

Jornal O Dia

Jornal Extra

 
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