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Uma escola para alunos de diferentes personalidades
14 Agosto 2018 | Por Fernanda Fernandes
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"Não pense na introversão como algo que necessita ser curado", destaca a autora Susan Cain

Apáticos, sem motivação, estranhos e/ou com dificuldades de trabalhar em grupo. Assim, muitas vezes, são citados os alunos mais introvertidos. Do outro lado, estão os que participam da aula verbalmente, interagem com o professor durante as explicações e apresentam trabalhos individuais ou em grupo com desenvoltura – os extrovertidos. Será que a escola é projetada para ambos os estudantes? Educadores estão considerando os diferentes tipos de personalidade na hora de planejar aulas e propor atividades?

Para o psicólogo Ricardo Eleutério dos Anjos, doutor em Educação Escolar, a relação professor-aluno é um dos principais elementos que contribuem para o processo de ensino e aprendizagem, e uma educação voltada aos diferentes tipos de personalidade é um premente desafio do educador.

Em entrevista ao Portal MultiRio, ele explica que, apesar de algumas pessoas terem uma tendência à introspecção, serem mais “fechadas”, enquanto outras são mais “abertas” e impulsivas, isso não é algo inato. Ou seja, o indivíduo não nasce introvertido ou extrovertido. Da mesma forma, segundo o psicólogo, não se pode dizer que existe um tipo “puramente” introvertido ou extrovertido. 

Alunos extrovertidos muitas vezes são vistos como exibicionistas

“Em linhas gerais, uma atitude introvertida de um aluno pode proporcionar reflexão, concentração e escuta. Daí alguns preferirem estudar em locais quietos, onde possam se concentrar e aprofundar assuntos. Por outro lado, uma atitude extrovertida se caracteriza por formas de agir, sentir e pensar mais explícitas, impulsivas e exibicionistas. Mas essa dinâmica vai ser definida por necessidades e interesses que são formados na atividade social do indivíduo, nas condições concretas da vida de cada um. Como diz o psicólogo russo Alexei Leontiev, a personalidade não nasce, ela se faz.” 

Ainda na visão do especialista, quando não se compreendem essas dinâmicas da personalidade, é possível que surjam alguns estereótipos.

“Uma atitude extrovertida pode ser interpretada como uma atitude arrogante, enquanto uma tendência introvertida pode ser interpretada como apatia do aluno. O problema é, portanto, quando naturalizamos essas formas de conduta, como se fosse algo inerente e estático da pessoa.”

O excesso de trabalhos em grupo 

Livro O poder dos quietos, de Susan Cain (Editora Agir)

Autora do livro O poder dos quietos e de textos sobre introversão e timidez publicados no jornal The New York Times, Susan Cain destaca, em sua palestra do TED (acrônimo de Technology, Entertainment, Design; em português: Tecnologia, Entretenimento, Planejamento), que a grande quantidade de trabalhos em grupo proposta em sala de aula – mesmo em Matemática ou Redação, que poderiam depender de “voos solo de pensamento” – demonstra uma expectativa de que as crianças ajam como membros de um comitê, e faz com que as que preferem simplesmente trabalhar ou ficar sozinhas costumem ser vistas como estranhas ou, pior, como problemas. A autora questiona, ainda, o porquê de se fazer com que os introvertidos sintam-se culpados por vez ou outra querer estar sozinhos.

“A solidão é, muitas vezes, um ingrediente crucial para a criatividade. [...] A solidão importa e para algumas pessoas é como o ar que respiram. E, de fato, sabemos há séculos do poder transcendente da solidão. Só agora é que começamos, estranhamente, a esquecê-lo.”

Na visão da autora, escolas são geralmente projetadas para os extrovertidos e sua necessidade de muita estimulação. Em seu livro, ela faz um apelo.

“Parem com a loucura de trabalho em grupo constante. Precisamos de muito mais privacidade, liberdade e autonomia no trabalho e na escola. Claro que precisamos ensinar às crianças a trabalhar juntas, mas também temos que ensiná-las a fazer isso sozinhas, o que é particularmente importante para crianças extrovertidas. Elas precisam trabalhar sozinhas porque, em parte, é daí que vem o pensamento profundo.” 

Em busca do equilíbrio

Para Ricardo Eleutério, se a professora ou o professor entender que o bom aluno é somente aquele que faz perguntas e participa ativamente de toda a aula, aí, então, a escola estará se voltando aos extrovertidos.

“Com a tendência pedagógica pautada no empreendedorismo, o que a educação escolar espera do aluno são atitudes extrovertidas. Essa visão pragmática desdenha uma atitude introvertida, como se isso fosse ruim. Mas não podemos nos esquecer de que uma atitude introvertida é indispensável para a apropriação de determinados conteúdos que exigem reflexões, um distanciamento momentâneo das várias atividades da vida cotidiana”, explica o psicólogo. 

Professores devem equilibrar métodos de ensino para servir a todas as crianças da turma

 “Os processos de introversão e extroversão devem ser compreendidos na sua contradição e num movimento dialético. O ser humano precisa desenvolver ambas as capacidades para que se desenvolva de forma integral e completa. Assim, o papel da escola seria o de promover a superação dessa

dicotomia”, conclui.

Como incluir e valorizar igualmente todos os alunos

No capítulo Como educar crianças quietas em um mundo que não consegue ouvi-las, Susan Cain propõe aos professores alguns pensamentos, listados a seguir:

– Equilibre seus métodos de ensino para servir a todas as crianças da turma. Extrovertidos tendem a gostar de movimento, estímulo, trabalho colaborativo. Introvertidos preferem palestras, tempo de descanso e projetos independentes. Faça uma mistura justa.

– Um pouco de trabalho colaborativo é bom para introvertidos, e até mesmo benéfico. Mas ele deve acontecer em grupos pequenos – pares ou trios – e ser cuidadosamente estruturado para que cada criança saiba seu papel.

– Faça com que os alunos extrovertidos aprendam com seus colegas introvertidos. Ensine a todas as crianças como trabalhar de forma independente.

– Não coloque crianças quietas em lugares próximos às áreas de “alta interação” da sala de aula. Elas não vão falar mais nessas áreas; apenas vão se sentir mais ameaçadas e terão problemas para se concentrar. Facilite a participação em aula para os introvertidos, mas não insista.

– Introvertidos, muitas vezes, têm um ou dois grandes interesses que não são necessariamente compartilhados por seus colegas. Às vezes, eles são influenciados a se sentir estranhos pela força dessas paixões, quando, na verdade, estudos mostram que esse tipo de intensidade é um pré-requisito para o desenvolvimento de talentos. Elogie essas crianças por seus interesses, encoraje-as e ajude-as a encontrar amigos que pensem de forma parecida, se não na sua sala de aula, fora dela.

– Não pense na introversão como algo que necessita ser curado. Se uma criança introvertida precisar de ajuda com habilidades sociais, ensine-a ou recomende treinamento fora do horário de aula, exatamente como faria com um aluno que precisa de atenção extra em Matemática ou leitura.

 

Fontes:
Livro O poder dos quietos, de Susan Cain.
ELEUTÉRIO, Ricardo. A teoria dos tipos psicológicos de Jung e sua contribuição para a relação professor-aluno.

 
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