Foi no contexto do Movimento Escola Nova e da Revolução de 1930 que a discussão sobre a qualidade no ensino começou a ganhar relevância no cenário nacional. O processo de modernização pedagógica se iniciou nos últimos anos da década de 1920, durante a gestão de Fernando de Azevedo na Diretoria de Instrução Pública do Distrito Federal, e se ampliou, significativamente, quando Anísio Teixeira encabeçou, entre 1931 e 1935, a administração da instituição. Com ele, a educação pública do Rio de Janeiro tornou-se integral, em dois turnos, e as edificações escolares passaram a se basear em rigorosa análise de suas instalações, a fim de oferecer aos alunos não apenas salas de aula, mas também laboratório, auditório, ateliê, biblioteca, quadra esportiva, gabinete médico-odontológico, etc...
Embora ambos, Fernando de Azevedo e Anísio Teixeira, integrassem o Movimento Escola Nova, o segundo abandonou a arquitetura neocolonial do final da República Velha – defendida pelo primeiro –, para encampar as características funcionais e mais econômicas do estilo protomoderno art decó, que articulava as linhas curvas aos volumes geométricos simples, sem, contudo, abrir mão do uso de materiais nobres. O embate entre as duas propostas, a neocolonial e a modernizante, marcou as décadas de 1930 e 1940.
Em crítica à opção construtiva feita por Teixeira, José Mariano Filho, um dos defensores da arquitetura neocolonial, dizia: “O momento teria sido propício para se erguerem monumentos de arte [...] mas se estabeleceu um padrão ínfimo, miserável [...] As gerações futuras poderão em justiça julgar a vulgaridade da época em que estamos vivendo”. Enéas Silva, arquiteto das escolas anisianas, defendia-se: “A concepção, baseada em eficiência e economia, cumpre com as funções para as quais foram projetadas, em sua plenitude”.
Na verdade, a Constituição autoritária do Estado Novo freou o avanço da proposta educacional de Anísio Teixeira, tendo sido retomada, no Rio de Janeiro, entre 1937 e 1945, uma política tida, pelos defensores daquela pedagogia, como “desmobilizante e pragmática”. As características arquitetônicas tradicionais (neocoloniais) também voltaram a ser valorizadas, embora combinadas com alguns elementos modernos, como é o caso das escolas Barão de Itacurussá, na Tijuca, e Campos Salles, na Praça da República. Por outro lado, o governo de Getúlio Vargas também respaldava o desenvolvimento da arquitetura moderna, tendo mandado construir o prédio do então Ministério da Educação e Saúde (o Palácio Capanema), inaugurado em 1943 e considerado o marco inicial do estilo no Brasil.
Com o término da Segunda Guerra e a promulgação da Constituição de 1946, o sistema educacional passou por mudanças significativas. Muito do idealismo da fase anterior ganhou nova força e a arquitetura moderna se consolidou como proposta construtiva. Inaugurada em 1952 e construída na parte central do Conjunto Pedregulho, em Benfica, para que a escola fosse o ponto nevrálgico da interação comunitária, a E.M. Edmundo Bittencourt é um marco desse momento histórico da educação carioca. Além de ter retomado a proposta de escola de Anísio Teixeira, sua construção encerrava toda uma filosofia de atendimento às populações de baixa renda. Outra unidade escolar que bem exemplifica a concepção educacional e arquitetônica dos anos 1950 é a E.M. Grécia, erguida na Avenida Brás de Pina, na Vila da Penha.
A emergência quantitativa
Nos anos 1960, a ascensão do então governador do estado da Guanabara, Carlos Lacerda, e o posterior Golpe Militar, levaram a uma ruptura oficial com o pensamento de Anísio Teixeira. Além de uma filosofia mais conservadora, o intenso crescimento populacional do Rio de Janeiro pressionava os governos a uma ampliação da oferta de vagas e de escolas. O modernismo se firmou como a nova arquitetura escolar, mas em parâmetros muito distintos do momento anterior. A simplicidade e o baixo custo da construção continuavam sendo questão premente, mas o que mais importava, agora, era a quantidade de alunos atendidos e a massificação do ensino. Fazer a população aprender a ler, a escrever e a fazer as quatro operações matemáticas, em turnos de quatro horas, tornou-se a principal preocupação curricular.
Nessa época, o arquiteto Francisco Bologna dirigia o Departamento de Prédios e Aparelhamento Escolar (Dpae) da Secretaria de Educação, e introduziu um sentido industrial à construção das unidades de ensino, utilizando elementos pré-fabricados. Ele projetou cinco tipos diferentes de prédios, facilmente adaptáveis a qualquer terreno, mas um deles – o da E.M. Joaquim Abílio Borges, no Humaitá, com três pavimentos, dez salas de aula e um pátio coberto que também servia de refeitório – tornou-se padrão, por ter conseguido atingir o mínimo essencial.
Paralelamente às construções do tipo Bologna, centenas de unidades de ensino também foram erguidas pela Fundação Otávio Mangabeiras (FOM), criada durante o governo de Lacerda a fim de angariar a parceria da iniciativa privada para a área de educação. Essas escolas eram feitas em cerca de duas semanas para durarem pouco mais de cinco anos (embora algumas existam até hoje), com a justificativa de tratar-se de uma “solução provisória e emergencial” para atender à demanda por vagas. A maioria foi construída em bairros periféricos e tinha o formato de galpão modulado, coberto com telhas Eternit, sem biblioteca e sala de professores – às vezes, também sem pátio para recreação.
Todas essas novas diretrizes para a educação, aliadas ao fato de que o governo Lacerda determinou o fim do exame de admissão para a entrada no curso ginasial (equivalente ao segundo segmento do Ensino Fundamental atual), fizeram com que muitos denominassem o período como o “início do declínio de qualidade da educação pública”. Essa política manteve suas bases filosóficas e pedagógicas por cerca de duas décadas, embora com algumas alterações. No final dos anos 1960, foram feitas adaptações no projeto de escola do tipo Bologna, visando ampliar as áreas de administração e serviço, acrescentar duas salas de aula e mais um pavimento para a instalação de uma quadra de esportes e vestiários, no térreo. Os tijolos aparentes da fachada também foram revestidos. A arquitetura dessas escolas ficou conhecida como estilo Caixote.
Os ideais de educação integral de Anísio Teixeira só seriam retomados na década de 1980, com o projeto do vice-governador Darcy Ribeiro (gestão Leonel Brizola) de construção dos Cieps. Embora a proposta não fosse nova – “já era defendida pelos melhores educadores brasileiros há 50 anos”, segundo o próprio Darcy –, trazia a novidade da escala industrial da construção e da extensão do número de alunos atingidos. As escolas de turno de quatro horas continuaram, contudo, sendo maioria, não só em função da herança da estrutura educacional recebida, mas também pela enorme demanda por vagas na rede pública.
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