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Mais atenção para o ensino profissionalizante
24 Junho 2015 | Por Sandra Machado
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Embora esteja em expansão, o Censo da Educação 2013 revelou que ainda é pequena a parcela dos brasileiros que optam pela formação técnica – apenas 7,8%, contra 76,8% dos australianos, 69,7% dos finlandeses e 51,5% dos alemães, segundo os dados do Centro Europeu para o Desenvolvimento da Formação Profissional (Cedefop). O modelo educacional brasileiro, muito focado em levar os estudantes às universidades, parece não considerar a crescente demanda por mão de obra qualificada de nível técnico no país, fenômeno que, inclusive, aumenta as chances de empregabilidade. De acordo com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), mais de 70% dos formados em cursos de nível médio conseguem emprego no primeiro ano após concluída a formação.

antonio3A habilitação profissional técnica está em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394, de 20/12/96), que determina três níveis de educação profissional na legislação em vigor no Brasil. No Básico, estão os cursos destinados a jovens e adultos sem escolaridade preestabelecida; no Técnico, quem esteja cursando ou tenha concluído o Ensino Médio; e no Tecnológico, quem busca formação superior, tanto de graduação como de pós-graduação.

Em 9 de junho de 2015, aconteceu o primeiro encontro do Fórum Estadual de Educação Profissional e Tecnológica do Rio de Janeiro, criado no ano passado, no Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet/RJ). O objetivo do Fórum é criar condições para dar treinamento a “pessoas que nunca tiveram emprego ou que foram demitidas recentemente, em face da crise econômica, para se adequarem ao mercado de trabalho, muito mais sofisticado e digital”, nas palavras do professor Antonio Freitas. Além de membro do Fórum, ele atualmente é diretor de Integração Acadêmica e pró-reitor da Fundação Getulio Vargas (FGV), conselheiro da Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec/RJ), diretor da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e foi membro do Conselho Nacional de Educação (CNE). Engenheiro de formação e com experiência docente, concedeu uma entrevista exclusiva ao Portal MultiRio a respeito da importância de se investir na formação técnica. 

Portal MultiRio – Por que motivos os estudantes brasileiros sonham tanto em chegar à universidade, mas não têm muito interesse pelos cursos profissionalizantes?

Antonio Freitas – No meu entendimento, em primeiro lugar por nossa herança ibérica. Em Portugal e na Espanha, é sedutor ser superior, mais importante do que qualquer trabalho com as mãos. Tradicionalmente, no Brasil, quem faz curso técnico e profissionalizante é de origem mais humilde. Ainda existe um verdadeiro preconceito e a experiência prática é vista como bobagem, embora tenha gente muito bem preparada. Conheço uma moça que foi técnica em Mecânica, depois se formou em Medicina e, hoje, atua como neurocirurgiã. As próprias escolas não induzem à formação profissionalizante.

PM – E como ela é vista no exterior?

AF – Morei muitos anos nos Estados Unidos e lá meus filhos tinham muita atividade manual na escola. Minha filha, que chegou a aprender como fundir metais, aprendeu violino brincando. As crianças fabricavam protótipos de aparelhos de rádio. Cada aluno aprende a tocar um instrumento musical. Mas todos são ensinados a enxergar essas habilidades manuais com a mesma importância que é dada ao conteúdo curricular.

antonio4PM – Por que tem sido tão difícil equilibrar esta equação entre oferta de possibilidades e interesse dos estudantes no Brasil?

AF – Aqui isso não é feito enquanto as crianças são menores, principalmente nas escolas públicas, de ensinar a importância da habilidade manual e de como ela pode ser usada profissionalmente. Os pais ficam empurrando os filhos para a universidade. Hoje a média de evasão no Ensino Médio gira em torno de 50%. O garoto chega na sala de aula e vê que aquela chatice toda não motiva nada. No Fórum, temos a ideia de que os estudantes possam se encantar com alguma coisa, que depois possam mostrar em casa e ser aplaudidos. Muitas vezes, o próprio professor não sabe para que serve a Trigonometria ou o Cálculo Diferencial. Para que aprender, então? O Brasil precisa muito dessas pessoas que têm o conhecimento técnico.

PM – Qual a importância do investimento no ensino profissionalizante?

AF – Aumentar a renda não é dar qualquer tipo de bolsa (Bolsa Escola, Bolsa Família...), é dar capacidade para o sujeito progredir na vida. Não há outra forma. A população brasileira está envelhecendo e, a partir de 2050, está prevista a diminuição populacional do país, nos mesmos moldes do que ocorre na Europa e na Ásia, com todas as suas implicações previdenciárias. A formação técnica tem seu valor mesmo para quem possui graduação no Ensino Superior. Um bom exemplo é a reciclagem possibilitada pelos cursos de especialização ou de MBA1, mais voltados para aspectos práticos – como seria a Implantodontia ou a Ortodontia para alguém que já é dentista. Eles também ajudam a mudar de área de atuação, como no caso de um psicólogo que deseje passar a trabalhar com recursos humanos e busque qualificação específica.

PM – Que incentivos o governo federal tem dado, além do Pronatec?

AF – O Sistema S2 recebe porcentagem de todos os salários pagos aos trabalhadores no Brasil para financiar os cursos técnicos, que, por sinal, são pagos e nem sempre saem barato. Também recebe benefícios, como a isenção de diversos impostos. São cursos ótimos. Os pais da classe média preferem que seus filhos façam universidade, muito embora a formação técnica possa dar mais renda e mais felicidade. Às vezes, mesmo com a formação superior, a pessoa não tem tanta satisfação. O Brasil perde pela falta da apresentação do estudo técnico desde os primeiros anos do Ensino Fundamental, o que facilita à criança descobrir os seus talentos. Indiretamente, isso pode incrementar o desenvolvimento tecnológico. Hoje não há nada nesse sentido, nem no ensino público, nem no privado. Nossa grande falha é não fazer a introdução da Educação Profissionalizante desde o início do Ensino Básico, conforme previsto na Lei de Diretrizes e Bases (LDB).

PM – Que aspecto ganhou destaque nessa primeira edição do Fórum Estadual de Educação Profissional e Tecnológica do Rio de Janeiro?

AF – Para mim, é triste perceber que até as escolas técnicas começam a discriminar os cursos profissionalizantes. A Celso Suckow está deixando de ser técnica para se transformar em instituição de Ensino Superior. As pessoas têm o sentimento de que é mais importante ser professor no ensino universitário. A própria Faetec/RJ presta um grande serviço, mas já está entrando no sonho do nível universitário. O Brasil tem mais de 3 mil instituições de Ensino Superior, mas quer abandonar a escola técnica. Tem que investir na educação básica tecnológica para que as pessoas valorizem e compreendam o que ela é, discriminando no sentido positivo.

PM – E sob o ponto de vista das crianças, como seria?

AF Aprender a realizar atividades com as mãos, além dos desafios puramente intelectuais, é meio lúdico para as crianças. Nem sempre isso envolve muito dinheiro. Uma vez, fui a um museu na Alemanha e encontrei um professor aposentado ensinando a um grupo de alunos como construir um robô. Perguntei se saía caro e ele disse que uns 30 euros, cerca de cem reais. Como saber se a criança tem pendor para alguma coisa se ela não experimenta? O ideal seria se a gente pudesse formar comunidades de aprendizagem, reunindo naturalmente pessoas com o mesmo interesse, independentemente de poder aquisitivo, crença, cor ou qualquer outro atributo pessoal.

Acompanhe, na próxima semana, mais uma matéria sobre o ensino técnico no Rio de Janeiro.

Fontes: Portal G1 e site Empregos

 

Referências:
¹ MBA é a sigla para Master of Business Administration, em inglês, ou Mestre de Administração de Negócios, considerado no Brasil um curso de especialização.
² Sistema S é o conjunto de nove instituições de interesse de categorias profissionais, estabelecidas pela Constituição brasileira: Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), Serviço Social do Comércio (Sesc), Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Social da Indústria (Sesi), Serviço Social do Transporte (Sest), Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat) e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

 
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