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Como se referir a pessoas com deficiência: a evolução dos termos ao longo do tempo
21 Setembro 2020 | Por Fernanda Fernandes
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Termos e expressões mudaram ao longo do tempo. Atualmente, "pessoa com deficiência" é a expressão mais aceita no Brasil (Imagem: Patricia Bigio/ GEA MultiRio)

“Inválidos”, “incapazes”, “defeituosos”, “excepcionais”, “portadores de deficiência”...muitos foram os termos usados ao longo dos anos para se referir a pessoas com deficiência. Esta é considerada, atualmente, a maneira mais adequada, definida pela Convenção da Organização das Nações Unidas Sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (2006), em vigor desde 2008 no Brasil e já assinada por mais de 170 países.

O termo valoriza as diferenças, não camufla a deficiência e ressalta o indivíduo, independentemente de suas condições sensoriais, intelectuais ou físicas.

“Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.”

Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006)

A evolução dos termos ao longo dos anos

Segundo especialistas, as terminologias podem se modificar culturalmente a cada época, acompanhando valores vigentes em cada sociedade.
“[...] Discutir a influência da terminologia é de fundamental importância, pois ela reflete os conceitos, as percepções e os valores de uma sociedade, bem como pode carregar, de modo implícito, o preconceito”, destacam as pesquisadoras Maristela Ferro Nepomuceno, Raquel Martins de Assis e Maria Nivalda de Carvalho Freitas, no artigo Apropriação do Termo “Pessoas com Deficiência”  publicado neste ano, na Revista Educação Especial, da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul.

As autoras destacam que a perspectiva histórica permite constatar o desgaste de palavras hoje consideradas pejorativas e amplamente rejeitadas –  como os termos “anormal”, “retardado”, “débil”, “incapaz” e “ineducável” –, mas que já foram utilizados para designar pessoas com deficiência em outro contexto histórico e cultural.

“Alguns termos podem reduzir as potencialidades da pessoa, reforçando a sensação de déficit e fracasso pessoal, tais como ‘inválido’ e ‘deficiente’”, explicam as pesquisadoras, ressaltando que o abandono de terminologias que desqualificam a pessoa é fundamental para gerar inclusão.

Veja porque algumas expressões devem ser evitadas:

“Deficiente”: a utilização do termo de forma isolada ressalta apenas uma das características que compõem o indivíduo, definindo-o por sua deficiência.

“Excepcional”: entre os anos 1950 e 1970, o termo era usado para referir-se a “indivíduos com deficiência intelectual”. Depois, nas duas décadas seguintes, passou a referir-se, também, a pessoas com altas habilidades/superdotação.

“Pessoa deficiente”: o substantivo “deficiente” passou a ser utilizado como adjetivo, sendo atribuído o valor de “pessoa” àqueles que tinham deficiência. Porém, acabou sendo contestado por indicar que a pessoa inteira seria deficiente.

“Pessoa portadora de deficiência”/“portadores de deficiência”: A expressão, proposta para substituir “pessoa deficiente”, foi adotada na Constituição Federal, em todas as leis e políticas públicas e em nomes de organizações e associações. No entanto, o termo não se aplica a uma condição inata ou adquirida. É como se a deficiência fosse algo que a pessoa possa às vezes “portar” e outras vezes não (como um documento ou um guarda-chuva). Não se diz, por exemplo, que alguém “porta” olhos verdes.

Além disso, a expressão “portador de deficiência" pode estigmatizar uma pessoa, de forma que a deficiência seja interpretada como sua principal característica.

“Pessoas especiais/ com necessidades especiais”: Os termos foram usados para substituir “deficiência”, em uma tentativa de amenizar a contundência dessa palavra. No entanto, todas as pessoas são diferentes entre si e têm alguma necessidade particular – não apenas as pessoas com deficiência. Além disso, o argumento usado em defesa dessa expressão – o de que “todos somos imperfeitos” – é criticado por esvaziar a discussão sobre os direitos das pessoas com deficiência.

Expressões relacionadas à Educação Especial Inclusiva

Além de alguns termos para se referir a pessoas com deficiência, outras expressões ainda geram dúvidas e trazem discussões relevantes para a sociedade. Confira.

“Aluno de inclusão”
Muitas vezes adotado para se referir a estudantes com deficiência, seu uso é equivocado. Afinal, a educação inclusiva diz respeito a todos, e não apenas a alunos da Educação Especial.

“Aluno normal”
“Aluno sem deficiência” seria a expressão mais apropriada. No passado, por desinformação e preconceito, acreditava-se na ideia de que uma pessoa com deficiência era anormal. Entretanto, a “normalidade” é um conceito relativo, questionável e ultrapassado.

Classes/turmas “normais” x “regulares”
Seguindo a mesma lógica do item anterior, o ideal é usar “classe regular” ou, ainda, “classe comum”. Segundo Romeu Kazumi Sassaki, consultor de inclusão social e um dos autores mais citados na área, “no futuro, quando todas as escolas se tornarem inclusivas, bastará o uso da palavra ‘classe’ sem adjetivá-la.”

Necessidades “educativas” x “educacionais” especiais
 “Necessidades educacionais especiais” é a expressão mais adequada ao que propõe a Convenção. A palavra “educativa” significa algo que contribui para a educação, e as “necessidades” não educam, são relativas à educação (educacionais).

Libras: língua x linguagem
A Língua Brasileira de Sinais não é uma linguagem – como as linguagens gestual e corporal, por exemplo –, e sim uma língua com estrutura gramatical própria, um conjunto de palavras, sinais e expressões organizados a partir de regras.

Cego x pessoa com deficiência visual
O termo “deficiência visual” abrange tanto a pessoa com cegueira, quanto a pessoa com baixa visão, conforme explica a professora Vilma Sampaio, do Centro de Transcrição para o Braille do Instituto Helena Antipoff (IHA) – órgão da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro responsável pela implementação das Políticas Públicas da Educação Especial.

“A cegueira, em uma visão educacional, abrange a pessoa com ausência total de visão até a perda de projeção de luz. Já a baixa visão é um comprometimento da função visual em ambos os olhos e que não pode ser corrigida através de cirurgia, de óculos, de lentes de contato; e precisa ser nos dois olhos”, elucida a docente, em vídeo publicado no PORTAL MULTIRIO.

“Surdo” x “pessoa com deficiência auditiva”
Segundo o Decreto N.º 5.626/05, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais, “considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso de Libras”.

A concepção clínico-terapêutica, que diferencia surdez e deficiência auditiva a partir da profundidade da perda auditiva, é criticada por tratar a surdez como doença em busca de uma cura, compreendendo o indivíduo na deficiência, e não por sua diferença. As identidades surdas são múltiplas e multifacetadas e a língua de sinais é a manifestação da diferença linguística relativa à comunidade surda. Pessoas com deficiência auditiva que adquirem e se comunicam por meio da língua oral de sua comunidade, não utilizam, necessariamente, a língua de sinais.

“O olhar da Educação não é ou não deveria ser mais no sentido patológico. Olhamos o surdo como um sujeito em potencial. Geralmente, falamos em ‘pessoas surdas’. Elas podem ser surdas por terem deficiência auditiva adquirida depois de ela ouvir, de ter uma língua – como, por exemplo, uma pessoa que ouvia, teve uma doença e perdeu a audição, mas consegue pensar pela língua oral. E há, também, os que já nasceram surdos ou criaram surdez em idade precoce, sem ter contato com a língua oral”, explica a professora Laura Jane Messias Belém, filha de pais surdos, mestre em Educação e que integra a equipe do IHA. “Outra questão é que o surdo não é mudo, é surdo. Mas, por não ouvir, não consegue expressar a fala ‘propriamente’”, acrescenta.


Fontes:
https://nacoesunidas.org/
SASSAKI, Romeu Kazumi. Como chamar pessoas que têm deficiência. Instituto Rodrigo Mendes/ Diversa.
SASSAKI, Romeu Kazumi. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. In: VIVARTA, V. (Org.). Mídia e Deficiência. Brasília: Andi; Fundação Banco do Brasil, 2003. Série Diversidade.
GESSER, Audrei. Do patológico ao cultural na surdez: para além de um e de outro ou para uma reflexão crítica dos paradigmas. Trabalhos em Linguística Aplicada, Campinas, 2008.
ALVES, Aline da Silva. Introdução à surdez e a libras no contexto da saúde. Parte I. Módulo 6/ Aline da Silva Alves; Margareth Prevot da Silva; Tatiane Militão de Sá; coordenação de Valéria Machado da Costa. Rio de Janeiro: Fiocruz/Icict, 2019.
FREITAS, Daniela Gonçalves da Silveira. Orientações para interação com deficientes visuais e auditivos. Instituto Federal da Bahia – MEC, 2018.

 
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