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O Enraizamento de Interesses dos Antigos Colonizadores: A Idéia de um Império Luso-Americano

A política administrativa de D. João visava implantar um Império que demonstrasse poder, exibisse prestígio e garantisse segurança aos seus súditos. Assim, o Estado português foi reproduzido na Colônia, com a instalação de seus ministérios e demais órgãos da administração pública e justiça, atendendo a necessidade de se criar cargos para os funcionários da Corte, fugidos de Portugal com D. João, e que eram a base de sustentação de seu Governo, junto com os comerciantes reinóis.

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Para a historiadora Maria Odila Silva Dias, "com a vinda da Corte, pela primeira vez, desde o início da colonização, configuravam-se nos trópicos portugueses preocupações de uma colônia de povoamento e não apenas de exploração ou feitoria comercial, pois no Rio teriam que viver e, para sobreviver, explorar os enormes recursos naturais e as potencialidades do império nascente, tendo em vista o fomento do bem estar da própria população local."

Em abril de 1808, D. João revogou os decretos que proibiam a instalação de manufaturas na Colônia, isentou de tributos a importação de matérias-primas destinadas à indústria, ofereceu subsídios para as indústrias de lã, de seda e do ferro, incentivando a introdução de novas máquinas. Criou, também, no mesmo ano, a Biblioteca Real, o primeiro Banco do Brasil, a Escola de Marinha e a Imprensa Régia.

O fim da proibição da existência de gráficas possibilitou o surgimento de jornais e revistas, assim como uma relativa circulação de notícias e idéias. Entretanto, essa liberalização não significava liberdade de imprensa. Por decisão do Governo a administração da Imprensa Régia caberia a uma junta composta por três autoridades encarregadas de "examinar os papéis e livros que se mandasse publicar e fiscalizar que nada se imprimisse contra a religião, o governo e os bons costumes." Assim, o ato que criava a imprensa na Colônia, criava, também, a censura. A aplicação da censura aos livros fez com que houvesse, nessa época, um intenso contrabando de publicações para abastecer a elite letrada da Corte.

O primeiro jornal publicado, de caráter quase oficial, foi a Gazeta do Rio de Janeiro. O primeiro número saiu no dia 10 de setembro de 1808, em papel de baixa qualidade, com quatro páginas, com distribuição no início semanal e depois três vezes por semana. Não publicava notícia que interessasse ao público em geral, tratando somente das relacionadas ao estado de saúde dos príncipes europeus; aos aniversários dos membros da família real, entoando-lhes louvores. Para o inglês Armitage, "a julgar-se do Brasil pelo seu único periódico, deveria ser considerado um paraíso terrestre, onde nunca se tinha expressado queixume."

Imagem 2Ainda em 1808, D. João criou o Real Horto (Jardim Botânico), como um jardim de experimentos científicos. Nele pretendia aclimatar todo o tipo de planta que pudesse ter produção comercial ou uso prático em farmácia, tinturaria ou outro tipo de indústria. Foram aclimatadas especiarias como a canela, o cravo-da-índia, a pimenta do reino, o chá, assim como frutas, entre elas o abacate, a manga e a carambola. Grande parte dessas novas espécies veio da Guiana Francesa. A produção de alimentos também foi desenvolvida, pretendendo-se incrementar as atividades agrícolas no novo reino e abastecer a capital.

Em 1809 foi criado um observatório astronômico, ao mesmo tempo em que foram reorganizados os arsenais, fundada a fábrica de pólvora e, em 1811, instalada a Academia Militar. Este órgão tinha entre as suas funções, a de promover um curso das chamadas ciências exatas (Matemática) e de observação (Física, Química, Mineralogia e História Natural). Deveria formar não apenas oficiais do Exército, como também engenheiros, geógrafos e topógrafos que pudessem dirigir obras públicas, como a abertura de estradas, minas, portos, etc. Essas medidas foram tomadas de acordo com a política de defesa da Colônia estruturada por D. Rodrigo, Ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, que também se preocupava em estabelecer canais de comunicação com todas as regiões. À preocupação de guerra aliava-se a necessidade de se comunicar com o interior do país. D. Rodrigo centralizou o eixo da vida administrativa da Colônia no Rio de Janeiro, que deveria impor-se às demais Capitanias. Os objetivos dessa política não eram só estratégicos, mas visavam, também, melhorar a produtividade da Colônia para fazer frente ao abastecimento da Sede do Governo. Para tanto mandou abrir estradas, cuidou da navegação dos rios e dos portos, e organizou a plantação de produtos necessários ao abastecimento da crescente população do Rio de Janeiro, facilitando o embarque dessas mercadorias para a Corte.

Ao Rio de Janeiro chegavam mercadorias e gêneros alimentícios tanto do exterior quanto de outras regiões do Brasil. As embarcações que passavam pela Baía da Guanabara traziam hortaliças e pequenos animais. Por terra chegavam animais de grande porte e produtos vindos da região das Minas e de São Paulo.

Imagem 4Para o melhor escoamento dos produtos cultivados nas áreas próximas à Corte foram abertas estradas, como a do Comércio e a da Polícia, que cortavam a região entre os rios Paraíba e Preto, ainda precariamente povoadas nessa época, em direção ao sul de Minas.

Esse conjunto de medidas contribuiu para tornar mais consistente a idéia de formação de um Império luso-americano com sede no Rio de Janeiro. Para tanto também influiu o fato de D. João ter doado sesmarias aos "antigos colonizadores"- funcionários e comerciantes portugueses -, com o objetivo de expandir a atividade agrícola e promover a interiorização desses que vão se tornar os novos colonos. A medida vai ajudá-lo, também, a resolver um problema que a abertura dos portos acarretara. Os comerciantes reinóis tiveram os seus interesses bastante prejudicados com essa decisão, pois perderam o monopólio do comércio na Colônia, ficando apenas com a exploração do tráfico negreiro, que já sofria pressões externas.

Entretanto, como analisa a historiadora Emília Viotti da Costa, " as leis decretadas por D. João, embora contribuíssem para liquidar o sistema colonial, não foram capazes de modificar todo o sistema, e nem tinham a intenção; daí a persistência de privilégios e monopólios. Permaneciam o oneroso e irracional sistema fiscal, a emperrada máquina administrativa, as inúmeras proibições: proibições de se deslocar livremente, de abrir caminhos, discriminações e privilégios que separavam, portugueses e brasileiros, criando animosidade entre eles."

Outra medida importante tomada por D. João foi conceder créditos do Banco do Brasil para que os novos colonos pudessem explorar e desenvolver as sesmarias recebidas. Situavam-se em terras férteis, na região de "Serra acima" (Vale do Paraíba), como se dizia na época, onde hoje se localizam Resende, Pati do Alferes, Valença e Vassouras, entre outras, parcamente habitadas de brancos, para que se tornassem proprietários rurais. Com essa medida pretendia promover o enraizamento desses antigos colonizadores, aos quais também distribuiu mudas e sementes diversas para experimentação, entre elas o café.

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Nas sesmarias localizadas nas terras de "Serra acima", os novos colonos criaram pequenos animais e plantaram para o seu consumo e o abastecimento da Corte. A alguns deles D. João garantira o monopólio do comércio na cidade do Rio de Janeiro. Essa "barganha" entre esse grupo e a Coroa se apresentava para os demais colonos, como uma relação de favores, sugerindo-lhes a idéia de que, para os negócios caminharem bem, tinham que estar sob a proteção da Coroa e próximos a ela.

Os colonos da decadente região mineradora, que já haviam se voltado para as atividades agrícolas e também tinham se dirigido para as terras de "Serra acima", aí se encontraram com os novos colonos, com os quais estabeleceram alianças por meio de casamentos, dando origem à formação de uma elite na parte centro-sul do país. Era esse bloco de interesses que sustentava a idéia da criação de um Império luso-americano.

Os "amigos do rei" dominavam a Corte. A política parecia girar em torno dos seus interesses. Essa situação descontentava muitos, que viam esse grupo como " gente corrupta, infame e depravada." Para as pessoas que pensavam assim, o Rio de Janeiro tinha se tornado uma "nova Lisboa," dominada pelos "portugueses" que oprimiam os "brasileiros".

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