ACESSIBILIDADE
Acessibilidade: Aumentar Fonte
Acessibilidade: Tamanho Padrão de Fonte
Acessibilidade: Diminuir Fonte
Youtube
Facebook
Instagram
Twitter
Ícone do Tik Tok

Muito que fazer pela Educação
16 Maio 2016 | Por Sandra Machado
Compartilhar pelo Facebook Compartilhar pelo Twitter Compartilhar pelo Whatsapp

saraiva200Há muitos anos, a pedagoga Terezinha Saraiva iniciou sua carreira como professora primária em uma escola no Morro do Salgueiro, no Rio de Janeiro. Com o tempo, sua vocação crescente em favor da Educação se refletiu em uma trajetória de excelência. Entre muitas conquistas profissionais, foi secretária de Educação e Cultura do Estado da Guanabara, no governo Carlos Lacerda (1960-1965), sendo a primeira mulher, no Brasil, a assumir tal cargo. Atuou como secretária executiva do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral). Em 1975, foi também a primeira secretária municipal de Educação e Cultura da cidade do Rio de Janeiro. Pertenceu ao Conselho Federal de Educação e ao Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro. Foi diretora de Tecnologia Educacional da Fundação Roquette-Pinto e da TVE do Rio de Janeiro, onde produziu o programa Jornal da Educação, que, no início de 1992, transformou-se em Um Salto para o Futuro. Membro da Academia Brasileira de Educação, ainda encontra tempo para coordenar os programas sociais da Fundação Cesgranrio. Memória viva da história contemporânea da Educação no Brasil, a professora Terezinha concedeu uma entrevista ao Portal MultiRio, na qual discute assuntos significativos da atualidade – como a criação de uma Base Nacional Comum Curricular, que vem acirrando o debate entre vários setores da sociedade.

Portal MultiRio – Como a senhora avalia a reformulação estruturada por Anísio Teixeira na década de 1930?

Terezinha Saraiva – A reformulação proposta e realizada por Anísio Teixeira pode ser considerada, a meu ver, um marco na linha do tempo da Educação brasileira. Anísio Teixeira propôs uma Nova Escola e a pôs em prática não só no antigo Distrito Federal, hoje cidade do Rio de Janeiro, como na Bahia, e teve influência em todo o país. Anísio Teixeira propôs um autêntico sistema de educação pública. Uma escola destinada para todos, na qual as crianças de todas as posições sociais iriam formar sua inteligência, vontade e caráter, hábitos de pensar, de agir e de conviver socialmente, terminando com o dualismo entre os “desfavorecidos” e os “privilegiados”. Anísio considerava que a escola primária deveria ser a grande escola comum, a escola de base em que se devia educar o povo brasileiro. Anísio propôs, também, mudanças no antigo Ensino Médio e no Ensino Superior, e chamou atenção para a importância da formação dos professores. São suas essas palavras: “Somente pela reformulação integral dos moldes e padrões da formação do magistério será possível injetar, na expansão desordenada do sistema escolar, as forças de revisão, de reforma e de correção que se impõem para sua gradual reconstrução”.

PM – O que se pode dizer sobre os movimentos de educação popular da década de 1960?

TS – Na década de 1960, houve vários movimentos de educação popular: Movimento de Educação de Base (MEB), Cruzada ABC, etc. Mas, a meu ver, o mais importante foi o realizado pelo Mobral, criado em 1967 e que teve início em 1970.

PM – Que avaliação a senhora faz do modelo do Plano Nacional de Educação?

TS – Depois de transitar por três anos e meio no Congresso, o Plano Nacional de Educação foi sancionado pela presidente da República em 26 de junho de 2014. O PNE estabeleceu 10 diretrizes, 20 metas e 254 estratégias a serem cumpridas até 2024. Algumas metas têm como prazo o ano de 2016. As metas vão desde a alfabetização de jovens e adultos, Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, Ensino Superior até a pós-graduação. Passam pela gestão e financiamento, e pela formação dos profissionais da Educação. Considero algumas metas propostas muito ambiciosas, impossíveis de atingir no tempo previsto. Quem acompanha os dados da educação brasileira, sobretudo da Educação Básica, está constatando que as metas previstas para 2016 não serão atingidas. Essa dificuldade agravou-se pelo momento que o Brasil está vivendo. O Plano Nacional de Educação tem como destino servir de régua e compasso para que estados, Distrito Federal, municípios e União ampliem as oportunidades em todos os graus e níveis da Educação, melhorem a qualidade do ensino e a eficiência da aprendizagem, definam políticas, diretrizes e metas parciais e finais, gerenciem com seriedade e competência seus próprios recursos e os que recebem por transferência. O PNE faz lembrar que está nas mãos dos gestores das três esferas de governo a responsabilidade na aplicação dos recursos destinados à Educação. E induz que é preciso oferecer cursos de formação de professores totalmente reformulados para aqueles que vão atuar nas várias etapas da Educação Básica e que é necessário não só assegurar planos de carreira, mas valorizar o trabalho dos profissionais que atuam na Educação Básica, de forma a equiparar seu rendimento médio ao dos demais profissionais com escolaridade equivalente. Enfim, o PNE propõe diretrizes para expandir a oferta educacional em todos os graus e níveis, melhorar a qualidade da educação e do desempenho escolar, aperfeiçoar a gestão e aplicação correta dos recursos destinados à Educação, estabelecer prioridades, perseguir as metas de modo a alcançá-las, etc. Está nas mãos dos gestores, dos professores e demais profissionais da Educação o salto, sobretudo de qualidade, que a Educação brasileira precisa empreender.

PM – É boa a proposta para um projeto de Base Nacional Comum? A centralização costuma gerar entraves burocráticos, e países como a Finlândia tendem a delegar cada vez mais autonomia para a administração local da educação...

TS – Considero de extrema importância a definição de uma base nacional comum curricular para a Educação Básica. Essa definição não caracteriza centralização, uma vez que 40% do currículo é de responsabilidade dos sistemas de ensino estaduais e municipais. É muito importante que se assegure o que deve ser ensinado e aprendido, desde a pré-escola até o final do Ensino Médio. O que o Brasil não pode é continuar assistindo a um índice elevado de crianças que, após três anos de escolaridade, não estão alfabetizadas. A qualidade do ensino e o bom desempenho escolar no Ensino Fundamental vão ter reflexo positivo no Ensino Médio e no Ensino Superior. Outra consequência importante da BNCC é ter reflexo nos cursos de formação de professores para a Educação Básica.

PM – Acesso e qualidade são garantidos hoje na educação pública?

TS – O acesso à educação e à qualidade do ensino não está garantido, ainda, na educação pública brasileira. Em termos quantitativos, houve acréscimo significativo na creche e na pré-escola. No Ensino Fundamental já estivemos mais próximos da universalização. De 2014 para 2015 houve um decréscimo de 1% nas matrículas. Os dados do Censo Escolar de 2015 revelam que, na faixa etária de 4 a 17 anos, em que a escolaridade é obrigatória, há 3 milhões de crianças e jovens fora das salas de aula. Em relação à qualidade do ensino-aprendizagem, o Censo Escolar 2015 e as avaliações nacionais e internacionais mostram que a escola pública brasileira está longe de resolver ou melhorar esse aspecto. No 3º ano do Ensino Fundamental – no qual, segundo o PNE, todos os alunos deveriam estar alfabetizados – é que se verifica a maior taxa de reprovação dos anos iniciais: 12,2%. A taxa de não aprovação no Ensino Fundamental varia entre os nove anos de duração: no 1º ano – 2,5%; no 2º ano – 3,7%; no 3º ano – 12,2%; no 4º ano – 8,8%; no 5º ano – 8,3%; no 6º ano – 18,4%; no 7º ano – 15,8%; no 8º ano – 13,6%; e no 9º ano – 12,5%. Com relação ao Ensino Médio, a taxa de insucesso na aprovação chega a 26,5% na 1ª série, 18,1% na 2ª, e 11,6% na 3ª série. Essas altas taxas de reprovação levam aos altos índices de distorção idade-série e à evasão.

PM – Por que o desempenho dos estudantes brasileiros deixa tanto a desejar nas avaliações internacionais? É uma questão de falta de recursos econômicos somente?

TS – Nessa resposta, refiro-me ao Ensino Fundamental e Médio. Há inúmeras variáveis que concorrem para o mau desempenho dos estudantes brasileiros nas avaliações não só internacionais (Pisa) como nas nacionais realizadas pelo MEC/Inep. Algumas variáveis são externas; outras, internas. Não concordo com a opinião daqueles que colocam como uma das principais a falta de recursos financeiros. Existem recursos. São mal aplicados. Entre os fatores internos que concorrem para o mau desempenho dos estudantes de Educação Básica, considero que o maior é a má e inadequada formação de professores, especialistas e gestores, que está a exigir urgente reformulação, por ser tema central de qualquer política pública de melhoria da qualidade e equidade da educação.

 
Compartilhar pelo Facebook Compartilhar pelo Twitter Compartilhar pelo Whatsapp