Em uma sociedade de consumo é preciso ter bom senso a todo momento, para descartar da lista de compras e desejos aquilo de que não se necessita. Crianças, no entanto, ainda não têm maturidade nem discernimento suficientes para entender o significado da publicidade e resistir aos apelos comerciais. Mais vulneráveis, elas sofrem cada vez mais cedo as consequências dos excessos do consumo, que vão desde a obesidade infantil até a “adultização” da infância.
De acordo com Adriana Carrijo, doutora em Psicologia pela UFRJ e especialista em Psicologia Clínica e Educacional/Escolar, os sinais de consumismo na infância podem ser facilmente identificados. “A demanda por objetos aparentemente fortuitos ou por incessantes coleções são sinais evidentes de consumismo. E esse comportamento se articula diretamente com os apelos das propagandas.”
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, dados referentes ao Censo de 2010 apontam que crianças até 14 anos representam mais de 45 milhões de brasileiros, quase 25% da população, o que justifica o investimento alto de publicidade nesse segmento.
Em geral, o consumo de produtos infantis é influenciado prioritariamente pela publicidade na televisão, depois pelo uso da imagem de personagens famosos nos produtos e, em terceiro lugar, pelas embalagens atrativas, como aponta uma pesquisa da InterScience, de 2003.
A influência das crianças
O Brasil já ocupa o segundo lugar entre os países com maior consumo de produtos infantis na faixa até 10 anos, segundo o Instituto Euromonitor. Isso porque as crianças também influenciam seus pais e responsáveis na hora das compras, e eles, muitas vezes, cedem até como compensação pelo pouco tempo dedicado aos filhos.
Uma pesquisa da ONG Instituto Alana mostra que as crianças brasileiras já influenciam 80% das decisões de compra de uma casa. E não só em relação a brinquedos, mas também na lista do supermercado e até em modelos de carros.
Nesse cenário, as instituições de ensino podem ser grandes aliadas, transferindo conhecimento e gerando nos alunos a consciência de um comportamento sustentável. Para Adriana Carrijo, a escola tem um papel fundamental como aparelho crítico e reflexivo para aquilo que vai além da racionalização da criança. “É a escola que estimula a abertura dos sentidos para a resistência inteligente, tanto sob o ponto de vista emocional, como de uma inteligência histórica e social.”
A psicóloga enfatiza que as escolas já consideram a proposta de uma educação para a reciclagem, firmada em princípios éticos de base ecológica. Muitas unidades da Rede Municipal do Rio já se mostram envolvidas.
Na 10ª CRE, o professor Álvaro de Almeida coordena o Núcleo de Educação Ambiental (NEA), que desenvolve projetos ligados à questão da sustentabilidade e de responsabilidade social, como o reaproveitamento de alimentos para adubo e compostagem de hortas, coleta seletiva, reaproveitamento de papel para confecção de blocos de anotações etc. “Buscamos levar propostas para os professores das escolas aplicarem com os alunos”, explica Álvaro.
Outra iniciativa interessante é o projeto de educação ambiental Ecos do Porto, uma parceria entre Secretaria Municipal de Educação, Concessionária Porto Novo e a ONG Defensores da Terra, envolvendo alunos das escolas municipais Darcy Vargas, Francisco Benjamin Gallotti, Antônio Raposo Tavares e do GEA Vicente Licínio Cardoso, na região portuária. O objetivo é reduzir o consumo e evitar o desperdício, estimulando a reciclagem e o reaproveitamento de materiais, na adoção de novos valores para uma melhor qualidade de vida.
Dever de casa
Pais e responsáveis também devem estimular uma educação para o não consumo, por meio do exemplo. Há quem defenda que um dos caminhos é restringir o tempo em que a criança fica em contato com a mídia – televisão e internet. A psicóloga Adriana Carrijo garante que estratégias como limitar esse acesso ou, ainda, evitar levar as crianças às compras são eficazes somente quando acompanhadas de uma conversa e uma reflexão junto com essas crianças. Caso contrário, as atitudes podem até mesmo estimular uma oposição a algo que, para a criança, possa representar apenas um jogo de poder.
Assim, pais e professores devem abrir um canal de diálogo e também propor atividades que não limitem o lazer a ambientes de consumo, estimulando reflexões e mudanças de comportamento. Outra opção interessante é incentivar a troca de brinquedos e a doação – neste caso, levando a criança a entender que está se desfazendo de algo que ela já aproveitou bastante para dar a alguém que vai recebê-lo como novo.
Ainda que o entendimento sobre o impacto das próprias ações no meio ambiente venha com o processo de formação de uma consciência crítica, ensinar a criança a refletir sobre suas escolhas antes de consumir é estimular que ela cresça de forma saudável e assuma comportamentos que levem a sociedade a se desenvolver de maneira responsável e sustentável.