Assim como o Rio de Janeiro, a cidade de Świebodzin, na Polônia – distante cerca de 400 quilômetros da capital Varsóvia –, também tem como atrativo turístico uma estátua de Cristo: com 36 metros, a do Cristo Rei é considerada a maior representação escultural de Jesus Cristo no mundo, à frente dos 30 metros do Cristo Redentor.
Mas essa não é a única semelhança entre os dois lugares. Desde que os conterrâneos do astrônomo Nicolau Copérnico, do músico Frédéric Chopin e do Papa João Paulo II desembarcaram no porto do Rio em busca de melhores condições de vida, a presença polonesa pode ser notada em vários cantos da cidade.
Os exemplos são diversos: estátuas e monumentos, celebrações culturais, missas em polonês e mesmo a homenagem no nome dado a duas unidades de ensino da Rede – a Creche Municipal Papa João Paulo II, no Grajaú, e a Escola Municipal Polônia, em Magalhães Bastos, inaugurada em 1959, quando alguns países foram prestigiados com a atribuição de seus nomes a diversas escolas municipais cariocas.
Até quando o assunto é futebol tem polonês na área: o Fluminense adotou o Papa João Paulo II como padroeiro do time – o João de Deus, tema de uma das canções da torcida.
Rio: porta de entrada para uma vida nova
Não se sabe definir com precisão a data de chegada dos primeiros poloneses ao Rio de Janeiro, tampouco quantos vivem hoje na cidade. No Brasil, o período de maior afluência desses imigrantes foi a segunda metade do século XIX, a partir de 1870 – ainda que colonos tenham chegado antes dessa data, acompanhando a imigração alemã.
A entrada se dava pelo porto do Rio de Janeiro – então capital do país –, onde permaneciam na Hospedaria Ilha das Flores até serem encaminhados a outras localidades, especialmente no sul do país, atraídos pelo clima semelhante ao europeu, sendo que Curitiba reuniu a maior concentração deles.
Estima-se que, até 1914, mais de 100 mil imigrantes vindos da Polônia chegaram ao país, a maioria colonos em busca de uma propriedade de terra. Devido à complicada situação econômica de seu país, emigravam vislumbrando melhores condições de vida no novo continente. O Brasil foi escolhido por facilitar a presença de estrangeiros para, entre outros motivos, substituir a mão de obra escrava.
Também vieram membros do clero e personalidades como o médico Pedro Luís Napoleão Czerniewicz, que, aceito como membro titular da Academia Imperial de Medicina, produziu manuais em língua portuguesa orientando leigos e acadêmicos nos atendimentos diários e nos primeiros diagnósticos. Suas publicações tornaram-se referência para a medicina no país.
Anos mais tarde, sobretudo entre as décadas de 1920 e 1940, a presença de meretrizes polonesas, muitas das quais judias, reforçou estereótipos antissemitas no Rio de Janeiro e em São Paulo, cidades onde o termo “polaca” era sinônimo de prostituta.
Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), criou-se no Rio de Janeiro o Comitê de Ajuda às Vítimas da Guerra na Polônia, sob o patrocínio da Cruz Vermelha brasileira. Quando o Brasil ingressou no conflito, foram abertas a União dos Voluntários Poloneses da América Latina e a Casa do Soldado Polonês no Rio de Janeiro, onde permaneciam os que aguardavam o transporte para retornar à Europa.
No total, 580 voluntários migraram para as Forças Armadas Polonesas, no Ocidente, e muitos lutaram nas fileiras do Corpo Expedicionário Brasileiro. No pós-guerra, grande parte dos imigrantes era constituída por ex-soldados das Forças Armadas Polonesas no Ocidente e por refugiados da guerra.
Um passeio cheio de história: do Centro a Copacabana
O “tour polonês” pela Cidade Maravilhosa começa no Centro, na Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro, onde, em 7 de julho de 1985, foi inaugurada uma estátua do Papa João Paulo II em comemoração aos cinco anos da primeira visita do pontífice ao local. A escultura em bronze, obra de Mário Agostinelli, fica no jardim em frente à porta principal.
Dali, rapidamente chega-se ao Monumento aos Mortos da Segunda Guerra Mundial (Monumento aos Pracinhas), na Glória, onde estão sepultados, no mausoléu, dez pracinhas descendentes de poloneses. A presença desses combatentes no monumento também está marcada por uma placa comemorativa, oferecida pela Associação dos Ex-Combatentes Poloneses (Stowarzyszenie Polskich Kombatantow – SPK) em agradecimento aos anos de amizade entre Brasil e Polônia.
Além disso, o local já sediou muitos eventos, que vão desde um protesto pelo estado de sítio decretado na Polônia, em 1981; até a exposição Liberdade, Soberania, Democracia: Polônia, 25 Anos, em outubro de 2014, uma parceria entre o Monumento aos Pracinhas e a Polônia Sociedade Beneficente do Rio de Janeiro – associação com sede no bairro de Laranjeiras.
O acontecimento mais marcante, no entanto, é a homenagem ao soldado polonês, em solenidade realizada todos os anos no dia 15 de agosto, da qual sempre participaram membros das Forças Armadas Brasileiras e representantes diplomáticos do país europeu.
No mesmo dia, é celebrada uma missa na capela de Nossa Senhora da Piedade, localizada no bairro do Flamengo (Rua Marquês de Abrantes, 215) e que funciona há mais de 60 anos como o centro paroquial da Polônia no Rio de Janeiro. Lá, é possível participar de missas inteiramente em polonês.
A construção data do século XVIII, no terreno de um palácio pertencente à rainha Carlota Joaquina, esposa do rei dom João VI, que a utilizou como oratório particular. Anos depois, Marquês de Abrantes comprou o terreno e ordenou a construção da capela de Nossa Senhora das Dores, já no estilo em que se encontra atualmente. Segundo Zdzislaw Malczewski SChr, autor de diversos artigos e publicações como A Presença dos Poloneses e da Colônia Polonesa no Rio de Janeiro, a Sociedade Beneficente Polônia – fundada em 1890 – assinou o contrato de aluguel da igreja em 1953 e se responsabiliza por ela até hoje.
Antes disso, durante comemorações cívicas e em ocasiões especiais, os poloneses frequentaram outras igrejas, em Niterói e no Rio de Janeiro, como a de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, na Praia de Botafogo.
Um quê de Polônia também pode ser visto na Urca. Na Praia Vermelha, está a estátua do compositor e pianista Frédéric Chopin. Confeccionada em bronze pelo artista Augusto Zamoyski, a peça foi doada à cidade pela comunidade polonesa depois da destruição da original, em Varsóvia, durante a invasão alemã.
Mas o monumento nem sempre esteve ali. Antes de chegar ao bairro, em 1964, a estátua ficou durante 15 anos em frente ao Theatro Municipal, na Cinelândia, sendo retirada depois de protestos por se tratar de uma homenagem a um artista estrangeiro na entrada de um templo carioca da música. No local, foi colocada uma estátua do maestro Carlos Gomes. A de Chopin seguiu para o local onde se encontra até hoje.
Se, no final de todo o trajeto, a fome bater, é só dar uma “esticadinha” até Copacabana, onde funciona desde 1948 o restaurante A Polonesa, que tem no menu comidas típicas do país eslavo. Smacznego (ou, em português, bom apetite)!
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