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Salvador na década de 1830, quando a cidade estava impregnada por forte sentimento antiportuguês. Litogravura de Thomas Abiel Prior. In: Narrative of Surveying Voyages of His Majesty's Ships Adventures and Beagle, 1839. Domínio público

Entre 1831 e 1833, movimentos de caráter federalista eclodiram em alguns pontos da província da Bahia. Esses movimentos expressavam o descontentamento não só em relação à política centralizadora do Rio de Janeiro, mas também um forte sentimento antilusitano, originado do fato de os portugueses controlarem quase que totalmente o comércio varejista, ocupando, ainda, cargos políticos, militares e administrativos.

Nos primeiros meses de 1831, manifestações contra os portugueses, considerados "inimigos" do povo, reivindicavam que fossem tomadas contra eles medidas que iam desde a deportação até a proibição de andar armados, a demissão dos que exercessem emprego civil ou militar e a extinção das pensões concedidas por D. João VI ou D. Pedro I.

A notícia da abdicação, em 7 de abril, fez com que os ânimos se acalmassem. Segundo o historiador Wanderley Pinho, "o governo promoveu festas e proclamou ao povo (23 de abril), procurando esfriar o ardor antiportuguês da massa popular, ao lembrar ser o novo imperador príncipe brasileiro de nascimento". Mas logo novas manifestações ocorreram. Além dos pronunciamentos que pregavam o antilusitanismo, a indisciplina militar e a destituição de oficiais portugueses, a partir de outubro de 1831 passava-se a aclamar "a Federação". Iniciava-se a crise federalista.

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Passeio Público, no Rio de Janeiro, cidade para a qual os baianos canalizavam seu antilusitanismo desde o governo de Pedro I, acusado de ceder aos interesses portugueses. Litogravura de Philippe Benoist, 1861. Domínio público, Biblioteca Nacional Digital

Em 1833, o descontentamento em relação à política centralizadora do Rio de Janeiro podia ser percebido no ódio que os federalistas, defensores da autonomia provincial, devotavam a D. Pedro I e aos portugueses. No dizer de Wanderley Pinho, o sentimento contra os portugueses, a principiar por D. Pedro I, estava presente nos pronunciamentos e nos programas dos federalistas: "O ex-imperador, tirano do Brasil, será fuzilado em qualquer parte desta província se acaso aparecer, e a mesma pena terão os que o pretenderem defender e admitir (...) Todo cidadão brasileiro fica autorizado a matar o tirano ex-imperador D. Pedro I, como maior inimigo do povo brasileiro".

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Típica residência das elites baianas. Mas a Sabinada não contou com o apoio dos mais abastados (nem dos mais humildes). Detalhe de litogravura de Thomas Abiel Prior, 1839. Domínio público

Em 1837, com a renúncia do regente Feijó, considerado incapaz de conter os movimentos contra o governo central, a insatisfação recrudesceu principalmente entre os militares e maçons da província baiana.

Todo o processo de instabilidade por que passava a Bahia culminou com o início da Sabinada, revolta liderada pelo médico Francisco Sabino Álvares da Rocha Vieira. Ao contrário de outros movimentos do Período Regencial, não mobilizou as camadas menos favorecidas nem conseguiu a adesão das elites da província, sobretudo os grandes proprietários de escravos e de terras do Recôncavo.

A Sabinada contou com a participação dos representantes das camadas médias da população, que desejavam manter a autonomia provincial conseguida com o Ato Adicional de 1834, a qual, sob a Regência Una de Araújo Lima, via-se ameaçada pela Lei Interpretativa, que retirava as liberdades concedidas anteriormente aos governos provinciais. A revolta foi precedida por uma campanha desencadeada por meio de artigos publicados na imprensa, de panfletos distribuídos nas ruas e de reuniões em associações secretas, como a maçonaria.

O estopim da rebelião foi a fuga de Bento Gonçalves, chefe da Farroupilha, do Forte do Mar, atual Forte São Marcelo, em Salvador, onde estava preso. Em novembro de 1837, os militares do Forte de São Pedro rebelaram-se, conseguindo a adesão de outros batalhões das tropas do governo. Sob a liderança de Francisco Sabino e de João Carneiro da Silva Rego, os sabinos, como ficaram conhecidos os revoltosos por causa do nome de seu líder principal, conseguiram controlar a cidade de Salvador por quase quatro meses. O presidente da província e outras autoridades, ao perceberem que não possuíam mais poder sobre as tropas, fugiram. Os sabinos proclamaram uma República, que deveria durar até que D. Pedro de Alcântara, o príncipe herdeiro, assumisse o trono brasileiro.

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A fuga de Bento Gonçalves do Forte São Marcelo (antigo Forte do Mar) foi o estopim para a eclosão da Sabinada, em Salvador. Foto: Vollectmoments. Creative Commons, Flickr

No entanto, a Sabinada ficou isolada em Salvador. Os revoltosos não conseguiram expandir o movimento, pois não possuíam o apoio de outras camadas da população. A repressão veio logo: no início de 1838, tropas regenciais chegaram à Bahia. Após o bloqueio terrestre e marítimo de Salvador, as forças do governo invadiram e incendiaram a cidade, obrigando os rebeldes a sair de seus esconderijos. Ajudadas pelos proprietários do Recôncavo, as tropas massacraram os sabinos. Os que escaparam foram severamente punidos por um tribunal que, por sua grande crueldade, ficou conhecido como "júri de sangue".