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Com a Abertura dos Portos, cresceu o comércio e o número de viajantes no Brasil, como se vê nesta gravura de Debret em que retrata o movimento na Praça do Paço, o principal porto do Rio na época. Domínio público, Biblioteca Brasiliana – USP

A liberdade de comércio, além de trazer para o Rio de Janeiro um enorme afluxo de mercadorias, especialmente inglesas, ocasionou também um intenso movimento de pessoas, especialmente de europeus. A cidade tornou-se um ponto de encontro de estrangeiros das mais variadas profissões, interesses e nacionalidades.

Representantes comerciais, comerciantes, caixeiros-viajantes, estudiosos, artistas e cientistas, entre outros, desembarcavam no Porto do Rio de Janeiro. Uns vinham com o objetivo de realizar negócios e enriquecer rapidamente; outros estavam interessados em fazer estudos sobre a fauna e a flora, as riquezas minerais, a geografia e as populações das regiões tropicais.

Entretanto, independentemente do tipo de interesse que os movia, muitos viajantes registraram em diários e livros suas impressões sobre a terra e seus costumes. O naturalista e mineralogista inglês John Mawe, observando o impacto da Abertura dos Portos sobre a vida e os hábitos dos brasileiros, assim escreveu: "O mercado ficou inteiramente abarrotado, tão grande e inesperado foi o fluxo de manufaturas inglesas no Rio logo em seguida à chegada do príncipe regente, que os aluguéis das casas para armazená-las elevaram-se vertiginosamente. A baía estava coalhada de navios, e em breve a alfândega transbordou com o volume das mercadorias. Montes de ferragens e pregos, peixe salgado, montanhas de queijos, chapéus, caixas de vidro, cerâmica, cordoalha, cerveja engarrafada em barris, tintas-gomas, resinas, alcatrão, etc. achavam-se expostos não somente ao sol e à chuva, mas à depredação geral: (...) espartilhos, caixões mortuários, selas e mesmo patins para gelo abarrotavam o mercado, no qual não poderiam ser vendidos e para o qual nunca deveriam ter sido enviados".

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Capa da edição de 1942 do livro de John Luccock, no qual ele narra as enormes mudanças ocorridas no Rio e no Sul, durante o período em que morou no Brasil – de 1808 a 1818. Domínio público

Um dos representantes comerciais que estiveram no Rio de Janeiro foi o inglês John Luccock. Chegou em meados de 1808 e permaneceu no Brasil durante dez anos, realizando negócios, procurando enriquecer e observando a terra e a sociedade tão diferentes de seu país. Anotou tudo o que viu e, tempos depois, escreveu um livro – Notas sobre o Rio de Janeiro e Partes Meridionais do Brasil – no qual comentava, admirado, as mudanças na vida das pessoas que aqui moravam, com o estabelecimento da corte portuguesa.

Entre 1815 e 1817, veio também o príncipe alemão Maximilian von Wied-Neuwied, conhecido pelo pseudônimo de Max von Braunsberg. Desenvolveu estudos sobre a natureza e os indígenas brasileiros. Percorrendo o litoral das províncias do Rio de Janeiro, Espírito Santo e sul da Bahia, chegando até Salvador, reuniu uma rica coleção de plantas, animais, insetos, objetos etnológicos e vocabulários de tribos indígenas, sobre os quais publicou vários livros.

Segundo especialistas, a contribuição de Maximilian à etnologia brasileira é extremamente valiosa. Por outro lado, seu estudo sobre os índios botocudos serve também para demonstrar a visão preconceituosa que os europeus tinham dos índios brasileiros, retratando-os como selvagens, à semelhança dos animais. Essa ideia sobre os índios reforçaria e justificaria a ação dos portugueses contra eles, a exemplo da "guerra justa", quando sua escravidão era aceita como medida civilizatória dos brancos.

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Gravura de Charles Rahl feita em 1822, a partir dos estudos do príncipe alemão Maximilian von Wied-Neuwied, que esteve no Brasil entre 1815 e 1817. Domínio público, Museus Castro Maya

Para D. João, as expedições dos estrangeiros ampliavam as informações sobre determinadas áreas da colônia ainda pouco conhecidas e sobre novas e possíveis formas de aproveitamento e ocupação do interior. Era como se o Brasil estivesse sendo redescoberto, cheio de maravilhas naturais e possibilidades de desenvolvimento.

Esses viajantes e suas observações foram extremamente importantes para a elaboração da ideia do Brasil na Europa. Por meio dessas informações, os europeus viam na América a possibilidade de concretização de seus ideais, uma espécie de Terra Prometida, de continente do futuro, sem os vícios da corrompida sociedade europeia. Viam nela, também, enormes perspectivas comerciais e a chance real de enriquecer.