A colonização foi, antes de tudo, a aventura da conquista e ocupação do sertão. Para os colonizadores portugueses, as terras americanas significavam um imenso vazio a ser preenchido com seus interesses, concepções e valores. Um grande deserto, um desertão, como as representavam. Daí a origem do nome sertão.
Um sertão que, como o Mar Oceano, exercia atração e gerava medos. Medos de seres reais e imaginários, de animais e plantas fantásticos, dos índios considerados bárbaros e selvagens, dos caminhos e grotões. Medos que ainda hoje se apresentam em denominações que traduzem angústia, ameaça e dúvida: Turvo, Encruzilhada, Sumidouro, Brumado, Rio das Mortes. Atração provocada pelas riquezas do sertão: valiosas madeiras, plantas miraculosas, aves e animais desconhecidos e metais preciosos. Atração provocada pelo número incalculável de pagãos e de idólatras – os adoradores de ídolos que deveriam ser convertidos à fé cristã.
Empreender a colonização significava, então, impor a ordem e a dominação sobre um território e sobre as pessoas que ali viviam, para transformá-las em súditos do rei de Portugal, em cristãos e trabalhadores forçados. Pessoas sempre apresentadas como portadoras de falhas, faltas e ausências. Em sua carta a Dom Manuel I, o escrivão Pero Vaz de Caminha já sublinhara a ausência de vestimentas dos nativos, o fato de não lavrarem a terra nem criarem animais, a necessidade e a importância da conversão à verdadeira fé. Anos mais tarde, outros cronistas e viajantes, como Pero de Magalhães Gandavo, em 1570, chamavam a atenção para um outro tipo de ausência. A língua falada pelos nativos não possuía as letras F, L e R, demonstrando que lhes faltavam Fé, Lei e Razão. Daí a permanente desordem em que viviam. Não por outras razões, tais pessoas e as terras que habitavam deveriam ser dominadas e ordenadas pelos colonizadores.
Os colonizadores portugueses conquistaram o sertão, formando cidades e vilas, plantando canaviais, extraindo metais preciosos ou criando gado. Impunham a autoridade do rei, difundiam a fé cristã e transformavam índios e negros africanos em escravos. Buscavam construir o Novo Mundo à semelhança do Velho Mundo, de onde vieram. No final do século XVI, o padre jesuíta Fernão Cardim, com certo orgulho, observava: "Este Brasil já é outro Portugal".
Quase sempre a imposição da ordem e da dominação dos colonizadores significou o desaparecimento de parte considerável das populações indígenas e africanas, além de muitos dos seus conhecimentos.