No Rio de Janeiro, a massa de escravos africanos dominava grande parte do contingente urbano. Portugal buscou essa mão de obra em diferentes partes da África: Moçambique, Guiné e Costa do Marfim, entre outras regiões. Os africanos atuavam, em grande parte, nos ofícios urbanos. Dominados, submetidos, sentiam o relho (rebenque), sob o peso da severa mão do capataz inibindo desobediências. Transportavam, diariamente, recipientes repletos de água, que abasteciam as moradias, além das cadeirinhas e das serpentinas (outra modalidade da cadeirinha); carregavam pesados tonéis e todo tipo de lixo doméstico; e espalhavam-se pelos caminhos, movimentando a cidade.
Sempre atarefados, podiam, em certos casos, oferecer os seus serviços ou os produtos feitos nas casas do senhor (escravos de ganho). Levando recados, corriam desabalados, descalços, pelas ruas de chão batido. A escravidão africana estava presente em toda parte.
Esse cativo, visto como sem alma pelos seus proprietários, era uma peça, uma ferramenta que poderia ser descartada ou substituída como qualquer objeto. Nos armazéns, verdadeiros depósitos de escravos, cartazes afixados anunciavam a chegada da mercadoria: negros bons, moços fortes, os trazidos pela última nau. Além dessas informações, o anúncio acrescentava a possibilidade de abatimento no preço. A negociação dessa mão de obra acontecia nas ruas do Centro, onde havia moradias e casas de comércio.
Os médicos da época argumentavam que os escravos africanos chegavam doentes e eram transmissores das moléstias, sendo responsáveis por transmitir epidemias, como a da varíola ou da sarna, entre outras doenças que assolavam a população. O então governador, Gomes Freire de Andrade (1757-1817), determinou, em 14 de janeiro de 1758, a transferência do mercado de escravos para a região da Praia do Valongo, localizada entre o Outeiro da Saúde e o Morro do Livramento.
Mais tarde, na tentativa de apagar as memórias da história do Valongo, por onde passaram incontáveis africanos escravizados, o nome foi modificado para Cais da Imperatriz, em homenagem à futura imperatriz Teresa Cristina de Bourbon (1822-1889), que chegou ao Brasil em 1843, para o casamento com D. Pedro II (1825-1891).
“Mas tudo que acontece na vida tem um momento e um destino”, disse o compositor Nando Reis, na canção Do Seu Lado. Após sucessivas transformações urbanas, a memória da região foi resgatada em 2011, como um importante espaço histórico. E, hoje, falar no Valongo é também referir-se ao Observatório do Valongo, Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza, ligado à Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tempo: futuro – dias melhores para sempre.