As forças políticas que atuaram na tumultuada Assembleia Constituinte reunida em 1823 – e que conduziriam o processo de emancipação política – e as que surgiram com o passar do tempo, sempre desejosas de manter em pauta os seus interesses, frequentemente divergiram, ao longo do período imperial. Enfrentaram-se com palavras, em discursos inflamados, ou até, pontualmente, em conflitos armados. A cidade do Rio de Janeiro, capital do Império do Brasil e local da aclamação do primeiro imperador, viveu dias turvos depois das comemorações da Independência. Decorridos os primeiros momentos, a popularidade de D. Pedro I (1798-1834) era marcante. Porém, gradativamente, essa glorificação se dissipou, na medida em que ele se indispôs com as correntes liberais, com a imprensa e até mesmo com a população em geral.
O quadro político que se configurou durante o Primeiro Reinado (1822 a 1831) foi desenhado por conflitos, rusgas e arruaças que, em cores fortes, refletiram os variados interesses políticos que estavam em jogo. De um lado, estavam aqueles que desejavam preservar as estruturas socioeconômicas vigentes; do outro, D. Pedro I, pretendendo aumentar e reforçar seu próprio poder, evidenciado na marca característica da Constituição Outorgada de 1824: o Poder Moderador, exclusivo do imperador. Afinal, com tantos desentendimentos surgidos após o Sete de Setembro, acontecia o que a canção de Eduardo Gudin e de Paulo César Pinheiro, descreve:
“Tudo o que mais nos uniu separou (...)
O mesmo alento que nos conduziu debandou”.
Apesar da intensa agitação que ocorria no Rio de Janeiro, palco onde a oposição e a situação agiam, as populações rurais mantinham-se indiferentes e mal-informadas sobre os acontecimentos. Segundo relatos do naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853), em suas viagens pelo Vale do Paraíba paulista, “as revoluções que operam em Portugal e no Rio de Janeiro não tiveram a menor influência sobre os habitantes desta zona paulista; (...) a mudança de governo não lhes fez mal e nem bem. (...) A única coisa que compreendem é que o restabelecimento do sistema colonial lhes causaria danos, porque se os portugueses fossem os únicos compradores de seu açúcar e café, não mais venderiam suas mercadorias tão caro quanto agora fazem”.
Possuidor de um perfil marcante e governando com política autoritária, o monarca sofreu forte oposição na Câmara dos Deputados e na imprensa. Um dos jornais de oposição, O Republico, divulgou em “tom subversivo”, segundo o escritor Octávio Tarquínio de Sousa, um soneto que dizia:
“Às armas! Brasileiros denodados!
Às armas! Contra os pérfidos malvados!”.
Grupos que apoiavam o imperador retrucavam: “Morra o redator do Republico”! No teatro das palavras, cada cena tinha um sentido, uma vontade, uma ação. D. Pedro I, por sua vez, também se manifestava na imprensa, como fazia no jornal Diário Fluminense. Segundo o historiador Nelson Werneck Sodré: “Nas ásperas polêmicas do tempo, participou pessoalmente (...). Tomou da pena ele mesmo, muitas vezes, e extravasou os seus impulsos. Assim, ora agia no terreno legal, promovendo denúncias por crimes de imprensa cometidos pelos que o combatiam (...), como brandia a mesma arma de seus adversários e utilizava a mesma linguagem, quando não se excedia”.
A situação desses dias confusos se agravou com os problemas econômicos e financeiros que o Brasil enfrentava, minando a popularidade do imperador. Apesar do apoio de alguns setores da sociedade – como o Partido Português citado pelo historiador Ilmar Rohloff de Mattos, o qual “defendia a reunião com Portugal, especialmente após a restauração do absolutismo por D. João VI” –, D. Pedro I não conseguia reverter a crise. E foi essa crise que, em 7 de abril de 1831, o levou à abdicação em favor do seu filho Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga (1825-1891).