Ser amigo do rei e estar perto da corte tornou-se um sonho acalentado por incontáveis pessoas a partir de 1808, quando a sede do governo de Portugal se transferiu para as terras da possessão americana. Funcionários e comerciantes, por exemplo, percebiam o quanto era fundamental tal proximidade. Empregos, negócios, títulos de nobreza, proteção e prestígio social estavam fortemente vinculados a essa convivência. Os habitantes da cidade e de áreas próximas rapidamente compreenderam essa realidade. O Rio de Janeiro tornara-se cenário real. Os que puderam, dispondo de recursos, fixaram residências na proximidade do poder, tentando usufruir das vantagens tão almejadas.
Inúmeras vezes, as melhorias importantes que aconteceram no Rio de Janeiro para abrigar da melhor forma a corte tropical contavam com a contribuição dos ricos moradores, que, em troca, receberam benefícios do então regente, D. João (1767-1826). Essa atitude de dar, receber e trocar era prática comum: uma das marcas da monarquia portuguesa com os seus súditos, formando uma crescente espiral de poder, no dizer da historiadora Mary Del Priore, “subordinada a uma estratégia de ganhos simbólicos que se estruturava sob atos de gratidão e serviços”.
Aos que eram tidos como amigos do rei, a vida sorria em promessas. Dominavam a corte, que parecia existir apenas para atender os interesses desses privilegiados. D. João teria conferido mais títulos de nobreza, nessa época, do que a Casa de Bragança (Família de Bragança) desde que assumira o trono lusitano. Os empréstimos ao Erário Real, inúmeras vezes, eram saldados de forma simbólica, com títulos de nobreza ou comendas.
Muitos dos que estavam fora desse universo de prestígio, desagradados e descontentes, indignavam-se, reclamavam. Pelos cantos da cidade, de portas abertas para as novidades do mundo, ouvia-se que a corte joanina era corrupta, infame e depravada. As queixas de moradores de outras partes do Brasil apontavam que o Rio de Janeiro “tinha se tornado uma nova Lisboa, dominada pelos portugueses que oprimiam os brasileiros”, no dizer do historiador Ilmar Rohloff de Mattos.
“Quantas transformações!”, diziam os que haviam chegado à cidade com a família real. Os que moravam no Rio de Janeiro pensavam da mesma forma? Possivelmente todos se indagassem o quanto suas vidas foram mudadas. Afinal, que tempos eram esses? Havia silêncios e sons.